27 fevereiro 2015

A Most Violent Year






É curioso e belo e desconcertante. Neste que toma lugar num dos mais violentos anos de Nova Iorque, invulgarmente a violência é parca e discreta, uma perseguição sem mácula ou uma esparsa mancha na gélida neve! Um ano mais violento é apenas o contexto, não o tema, subtil mas tenso, como um demorado nevoeiro que ensombra o dia.

"The result is never in question, just the path you take to get there." E o caminho não é claro, nem a direito, constrói-se por entre manobras e dúvidas, discursos e manipulações. E o caminho é feito de palavras e negociações, longo e inquieto, um caminho que treme entre os dois gumes da faca, entre a honestidade do presente ser e a promessa fácil de um futuro. O caminho quer-se honrado e limpo. Será tal possível?





Sóbrio e arrojado, "A Most Violent Year" é dono de uma inefável classe e inteligência, que se permeiam desde o soberbo trabalho de J.C. Chandor às brilhantes composições de Jessica Chastain e Oscar Isaac! Uma pérola que merece ser vista e sentida.


25 fevereiro 2015

Night Watch (Nochnoy dozor)






Sob a égide da eterna luta entre o Bem e o Mal, uma história inicialmente intrigante, dinâmica e empolgante, que acaba por perder alguma coerência e por nem sempre ser bem desenvolvida.




Um festim visual, sombrio e carregado, senhor de uma estética "cool" e estilizada, em que a escuridão tudo e todos domina! Sem dúvida o ponto forte deste "Night Watch"!


22 fevereiro 2015

Deux Jours, Une Nuit






"Deux Jours, Une Nuit" é de uma (aparente) simplicidade desarmante!

Sandra, prestes a regressar ao trabalho após baixa médica por depressão, fica a saber de uma votação entre a sua permanência na empresa ou um abono de 1000 euros para os seus colegas: o seu chefe "apercebeu-se" que apenas 16 funcionários e algumas horas extras fazem o trabalho que anteriormente 17 faziam e, assim, de uma penada, o seu posto de trabalho fica em risco. Portanto, acompanhamos a sua demanda, no espaço de um fim de semana, em tentar convencer os colegas a votarem na sua permanência em detrimento do abono. História simples, n'est ce pas?

Ora bem, nem por isso! Nunca o seria verdadeiramente, pois esta modesta premissa esconde uma complexidade severa, angustiante e concreta: no abstracto, ninguém hesita em afirmar quão injusta é esta situação para Sandra e que o correcto é ceder o abono a seu favor; quando confrontados, poucos são os que mantêm esta atitude, ou porque precisam do abono (há famílias para sustentar, casas para arranjar, ou o que seja) ou porque consideram então injusto perder esse dinheiro para alguém que afinal até esteve afastada por doença e poderá não desempenhar bem as suas funções. Ou o que seja.






E é precisamente o modo cru e exigente como esta narrativa é filmada e interpretada que acentua esse dilema e torna o filme extraordinário! Acompanhamos a demanda desesperada e suplicante de Sandra: cada telefonema, cada bater de porta, cada conversa, cada confrontação, cada esperança e cada derrube, cada sorriso e cada lágrima, mostrados pelos irmãos Dardenne com angustiante proximidade, como um constante apertar de alma! E quão arrebatadora e sublime é Marion Cotillard? De olhar franco e melancólico, é o confronto do seu desespero com as réstias de perseverança, do seu desânimo com a sua dignidade, afundar-se novamente na depressão ou lutar por si, pelos seus direitos, pela sua pessoa? E é a incerteza da sua expressão, o inconstante arrastar do corpo, o ensaiado discurso que por vezes quebra face à realidade, a resiliência e assertividade que de tempos a tempos a possuem, as lágrimas escondidas ou o cantarolar "rock'n'roll", personificando e enfrentando um limbo de contradições e êxitos!





"Deux Jours, Une Nuit" é assim avassalador e soberbo, potenciador de reflexão e, de maneira simultaneamente intricada e discreta, um murro no estômago!


21 fevereiro 2015

What We Do In The Shadows






Peripécias do dia-a-dia: partilhar casa, socializar, dividir tarefas, tentar entrar nas discotecas mais "in", discutir com arqui-inimigos, pagar a renda. Ah, e caçar vítimas de sangue fresco para se alimentar! Já vos disse que estamos a falar de vampiros?

"What We Do In The Shadows" é um irreverente e hilariante mockumentary que pega no mito do vampiro como se de um case-study se tratasse, dissecando hábitos, problemas e rotinas em formato de vida real para o olhar ansioso do sedento espectador! E com sucesso!





As deambulações diversas destes vampiros são-nos contadas de forma cativante e interpretadas de modo ainda mais divertido e entusiasmante! A sério, como não resistir a vampiros anacrónicos que se passeiam livremente pelas ruas de Wellington, que não tendo reflexo se arranjam frente aos retratos que os outros vão desenhando, que entendem o Google como uma forma de encontrar objectos perdidos há séculos ("You can find anything here./"I am looking for a scarf that I lost in 1912...google it!)? Digam-me, como não resistir a vampiros que apresentam uma notável e irónica semelhança com o Count Orlok do "Nosferatu" ou com o Gary Oldman no "Drácula de Bram Stoker"? Como?

Portanto, não percam mais tempo e vejam esta comédia de dentes afiados, que nos promete e entrega gargalhadas e sangue a jorros! O que se pode pedir mais?






17 fevereiro 2015

Segunda Lei da Termodinâmica





Occasionally I drop a teacup to the floor just to see it shatter; 
I'm disappointed when it doesn't pick itself up and come back together. 
Someday, perhaps.


(Dr. Hannibal Lecter - in Ko No Mono, Hannibal)


Irreversibilidade na acção, irreversibilidade dos eventos.

Direcção definida do tempo - avança impassível, sem consideração nem perdão.

Hannibal.


15 fevereiro 2015

Secretary


A crítica contém spoilers






Uma invulgar história de amor que não está presa às amarras das normas e do comum. Irreverente, cómica, refrescante. Provocativa. Belissimamente filmada e interpretada: atentem, por exemplo, na cena em que pela primeira vez Lee se submete aos desejos de Mr. Grey e digam lá se não exala classe e erotismo? Maggie Gyllenhall tem um desempenho portentoso: é simultaneamente sexy e cândida, perturbadoramente desequilibrada, apaixonadamente lasciva. James Spader, por sua vez, é possuidor de uma enigmática e dominadora aura que estabelece indubitavelmente o seu propósito. Ainda assim, acaba por fraquejar face à supremacia de Gyllenhal (é avassaladora, confirmem!), tal como Mr. Grey colapsa, extático, perante a plenitude de Lee.


12 fevereiro 2015

The Fall


A crítica que se segue compreende as duas temporadas de The Fall. Contém spoilers!





“Someone asked men why they were so afraid of women. They answered: 
 We’re afraid they might laugh at us. 

Someone asked women why they were so afraid of men. They answered: 
 We’re afraid they might kill us.” 



Uma tensa e sombria Belfast alberga uma encruzilhada de perseguição, violência e morte. Santíssima Trindade que orienta o modus operandi de dois solitários caçadores – Paul Spector e Stella Gibson – num vínculo tão perturbador quanto irremediável.

E porquê perturbador, porquê irremediável? Primeiramente, e de modo exemplar e magnético, o pormenor em nos ir revelando subtis paralelismos entre personagens que se “quereriam” antagónicas. E contudo, apesar de no seu núcleo serem indivíduos singularmente diferentes, ambos parecem partilhar um passado problemático, ambos querem estar em controlo e ambos agem de acordo com os seus impulsos, ambos registam em papel desejos e planos. Uma caracterização que achei curiosa. Depois, porque a própria narrativa toma partido dessas parecenças e da inerente dualidade dos seus protagonistas, explorando eficazmente quer a sua frieza quer a sua vulnerabilidade. Spector é o assassino, temível, repugnante e fraco, e Spector é também um pai que ama incondicionalmente a sua filha. Gibson é uma detective conceituada, inteligente e implacável, e Gibson é também quem acorda a meio da noite e se refugia dos pesadelos nas páginas de um caderno.






É fácil de nos apercebemos que em “The Fall” não importa tanto o destino quanto o longo caminho que percorremos até lá. O seu ritmo pausado e paciente permite um desenvolvimento sólido do argumento, numa concretização viciante do seu potencial. É a exploração exímia e quase que comparativa dos assassínios de Spector e da investigação de Gibson que nos absorbe por completo; é o omnipresente ambiente enigmático, lúgubre e agreste que nos envolve em tensão; é o incansável e dinâmico jogo de perseguição que nos manipula e ilude sucessivamente. Simultâneos mestres e peões neste confronto, Spector e Gibson digladiam-se vigorosamente e quão prazeroso é assimilar cada ímpeto das suas interpretações! Jamie Dornan é surpreendente e magnífico na criação de uma personagem que tem tanto de desprezível e doentio quanto de carismático; por sua vez, Gillian Anderson arrebata-nos com o seu porte charmoso e seguro, e com a sua determinação e frontalidade. Atentem nas cenas dos assassínios ou no “normal” dia-a-dia de Spector e na (quase) totalidade das falas e actos de Gibson e facilmente concordarão comigo! E a tão esperada confrontação entre Spector e Gibson? Grave e hipnótica!






A perfeição é difícil de alcançar…e “The Fall” não é seguramente perfeito. Falhou ao incluir histórias secundárias dispersas e sem aparente contribuição para a narrativa principal, como por exemplo, a criminalidade do ex-marido de uma das vítimas e a corrupção de um dos agentes policiais que culmina no seu suicídio. E a conclusão da segunda temporada pareceu-me algo precipitada. Se não houver continuação, é um final muito em aberto que nem sequer é satisfatório – Spector terminar assim de forma tão abrupta e apressada desiludiu! 






Mas a perfeição é sobrevalorizada e o facto inegável é que “The Fall” é um possante thriller psicológico, sufocante e enigmático, que explora de modo viciante e hábil a relação mutável predador-presa, seja através da narrativa sedutora e rude, seja pelas grandiosas composições dos seus irresistíveis protagonistas.



07 fevereiro 2015

Cinematograficamente Musicando (9)






Enigmático, vibrante, magnético, sem limites, assim era o magnífico genérico do filme "The Girl With The Dragon Tattoo". 

E se era, sem dúvidas, visualmente arrojado, creio que muito da sua garra também vinha da música que lhe dava corpo: Immigrant Song (Led Zeppelin), aqui numa vertiginosa e arrepiante versão de Trent Reznor/Atticus Ross, com voz de Karen O!






03 fevereiro 2015

Momentos (XXV)






Yes, I'm drunk. And you're beautiful. 

And tomorrow morning, I'll be sober but you'll still be beautiful.


The Dreamers - 2003